quarta-feira, 4 de março de 2015

Promessa brasileira do skate, Pâmela Rosa dribla dificuldades para crescer

Conheça a história da skatista de São José dos Campos, interior de São Paulo, atual campeã mundial de skate feminino e vice-campeã do X Games em 2014, nos EUA

O episódio aconteceu há dois anos, mas ainda segue vivo - e cheio de detalhes - nas memórias da skatista Pâmela Rosa, de São José dos Campos, interior de São Paulo, e da dona de casa Evânia Rosa, mãe da atleta. Era um dia comum de 2013. Na casa onde mora, Evânia acessou a caixa de e-mails e viu uma nova mensagem. Ao abrí-la, sentiu o coração disparar mesmo sem compreender o que o texto em inglês dizia. Puro instinto. Com a ajuda de um tradutor na internet, leu o que a intuição já lhe dizia: "Parabéns, Pâmela Rosa, você está convidada a participar do X Games, em Foz do Iguaçu". Gritos de alegria ecoaram pela casa.
Dias depois, uma carta chegou à residência da atleta oficializando o convite para a competição, tida como a Olimpíadas dos esportes radicais. Era o auge da carreira de Pâmela Rosa. Antes, já tinha conquistado títulos paulista, brasileiro e até um sul-americano. A chegada ao X Games era mais um feito de uma carreira precoce. Quando recebeu o convite, Pâmela tinha apenas 13 anos.


Hoje, aos 15, a skatista segue como uma promessa da modalidade no Brasil. Mas as conquistas que alcançou, ao mesmo tempo, são de quem já pode ser visto como uma realidade. Em 2014, foi vice-campeã dos X Games de Austin, no Texas, nos Estados Unidos. É bicampeã do circuito mundial de skate feminino. Tem quatro títulos brasileiros, dois sul-americanos e dois paulistas. Feitos que ela tem orgulho e que servem de motivação para lutar por mais.
– Quero conquistar o que já ganhei e ter um ano de alegrias. Uma medalha de ouro nos X Games é o meu sonho. (...) Planejo seguir competindo. Não penso em parar. Vou até minhas pernas não aguentarem mais – afirma a skatista, que, mesmo tímida para entrevistas, expressa em poucas palavras o amor pelo esporte.

EMOÇÃO NOS X GAMES

A emoção de Êvania e de Pâmela Rosa ao receber o convite para participar dos X Games ilustra o que é disputar a competição para quem vive no meio dos esportes radicais. Na casa onde mora, a skatista guarda os troféus e as medalhas que faturou ao longo da carreira. E como era de se esperar, a conquista do vice-campeonato do X Games de Austin, no Texas, nos Estados Unidos, é uma das mais especiais.

Antes da edição em Austin, Pâmela já tinha participado da competição em Foz do Iguaçu, no Brasil (sétima colocada), e em Los Angeles, nos EUA (oitava colocada). Nessas duas primeiras, a atleta aponta o nervosismo como um dos obstáculos que a atrapalhou na pista. Além disso, em Austin, diz ter tido uma preparação melhor para competir. Chegou ao torneio com antecedência e não enfrentou problemas para treinar.

Foram quatro dias de competições no Texas. Pâmela viajou acompanhada da mãe e de um médico amigo da família, Hamilton Freitas Filho, que ajuda a carreira da atleta. Na hora de competir, Pâmela afirma que estava tranquila. Estado bem diferente da mãe, que acompanha a filha desde os primeiros campeonatos.
– Fiquei muito nervosa – relembra, Evânia. – Quase passei mal. As notas iam aparecendo, e eu não enxergava direito. O nosso objetivo era ficar entre as seis, para ela participar do X-Games deste ano. Mas apareciam as notas e ela ficava em primeiro, em segundo... Quando vi a volta dela e vi que ficou em segundo, fiquei pasma. Estávamos descendo do palco e vimos muita gente. Cercaram a Pâmela. Aí que caiu a ficha. Começou a me dar tremedeira. Eu ficava igual boba. Não era qualquer medalha. Era a medalha do X Games. Até hoje nós olhamos, vemos o vídeo. É a mesma alegria – contou.


O sentimento da mãe descreve como foi o momento para a família. No Brasil, o pai da atleta, Paulo Cesar Leite Rosa, tinha dificuldades para acompanhar os resultados e era informado sobre o que acontecia nos EUA pelo amigo da família, o médico Hamilton. Pâmela demora alguns segundos para encontrar palavras quem expressem o sentimento pela conquista.
– Não sei explicar. Eu não acreditava quando eu via. Eu mesmo me surpreendi. Em Los Angeles e em Fox do Iguaçu, errei muito. Estava muito nervosa. Mas consegui me acalmar nesse. Foi, sem dúvida, uma dos momentos mais marcantes da minha carreira. Além dele, a chegada da carta (do X Games) e o primeiro campeonato foram marcantes – disse.

TÍTULOS COM SACRIFÍCIO

Ver um quarto repleto de títulos e medalhas, no caso de Pâmela Rosa, não é sinônimo de muito dinheiro na conta bancária. Apesar das conquistas, a skatista enfrenta dificuldades financeiras. Em maio, por exemplo, acontece a primeira etapa do Mundial, na França. De acordo com a mãe da atleta, a verba para a viagem ainda não está totalmente garantida.
Para se manter no esporte, Pâmela recebe apoio do médico Hamilton Freitas Filhos e, por meio da Lei de Incentivo Fiscal (LIF), é patrocinada por uma construtora de São José dos Campos. Hamilton conheceu a família de Pâmela Rosa há cerca de três anos, em um jogo de basquete da equipe da cidade. Ao saber da história da garota e das dificuldades que enfrentava, resolveu ajudar. Muitas viagens que a atleta faz são bancadas por ele.

– Ajudo ela e a família no que eu posso – afirma o médico. – Não tenho interesse nenhum em ganhar depois em cima disso. Depois que dei a carona para eles no jogo do basquete, em um dia de muita chuva, fiquei tocado com a história da família e da Pâmela. Tento ajudar de todas as formas. Quero dar a ela a chance de sonhar. É uma maneira de tentar evitar que mais um talento seja desperdiçado na cidade e no Brasil – comentou.

Pâmela é a caçula de uma família com quatro filhos, em que o pai trabalha em uma companhia de gás e a mãe é dona de casa. As dificuldades financeiras são desde quando a skatista deu os primeiros roles.

Pâmela começou a vida em cima do skate aos oito anos, quando um amigo da irmã a apresentou o esporte. Logo em seguida, ganhou dos pais um skate e, desde então, disputa torneios. As viagens para as competições sempre foram acompanhadas pela mãe, que costumava fazer caravanas com outros skatistas do bairro para os campeonatos. Viajavam com muita vontade, mas pouco dinheiro.

– Levava tudo de casa. Não tínhamos condições de ficar comendo fora. Já teve vezes que eles vieram embora de um campeonato com fome, porque íamos com a cara e com a coragem. Na volta, era uma marmitex para três. Era isso quase todo fim de semana. Em alguns torneios, saímos na sexta-feira e voltávamos só no domingo. E não ficávamos em hotel, não. Ou dormia no ônibus ou em pousada que cabia três no quarto, mas dormiam cinco – conta a mãe.



Para se ter uma ideia dos gastos, Êvania Rosa afirma que o custo de uma viagem de Pâmela ao X Games é de cerca de R$ 15 mil somente para a atleta. Como os gastos são altos, ela conta que já pensaram em desistir da carreira. Porém, a trajetória não foi interrompida por insistência do pai da skatista, Paulo Cesar.
– Ele falava: "Eu não tenho dinheiro, mas vou me enfiar no banco, vou ficar no vermelho, mas vocês vão para o campeonato". Pensamos em desistir, sim. Mas meu marido não deixou. Até hoje ele não deixa. Agora, o Hamilton também não deixa. Nós estamos no vermelho mesmo. Vai ter agora em maio a primeira etapa do Mundial, na França. Estamos no vermelho, mas ele fala: "Estamos juntos". Assim vamos em busca de parceiros – comentou Evânia Rosa.

PAGODE, CARNAVAL E ROUPAS DE "MENININHA"

Pâmela Rosa tem o skate como um companheiro quase que inseparável. Treina todos os dias e está sempre disputando competições. Mas, quando desce do shape, tem uma vida semelhante ao de todo adolescente. Cursa o segundo ano do ensino médio e sonha em fazer faculdade de educação física.

Nas horas vagas, gosta de estar com os amigos e ouvir músicas. O som nos fones de ouvido, aliás, ajudam a atleta a relaxar antes dos campeonatos. Pagode é o estilo musical predileto antes de descer qualquer rampa. O gosto pelo pagode e pelo samba ficou provado no carnaval deste ano, quando a atleta participou do desfile das escolas de samba de São Paulo pela Tom Maior, em um carro alegórico sobre esportes radicais.

– Sou bem normal. Estudo, gosto de estar com meus amigos... Desde criança, brincava com todo mundo. Nada mudou. Sou a mesma Pâmela. Gosto de me cuidar, principalmente para sair com meus pais. Gosto de me vestir como menininha mesmo – afirmou.
Assim, com sonhos ainda de menina, Pâmela Rosa diz nunca ter sofrido preconceito por ser uma mulher no mundo do skate. Mas sente a desvalorização que esse esporte tem perante outros no Brasil.
– Os próprios garotos me respeitam muito. Tem uns ou outros que falam que skate é para homem, mas sempre me respeitaram. Mas no Brasil, não dão muita prioridade para o skate. Eles dão muito mais para o futebol. Não enxergam muito o skate. Isso poderia melhorar – comentou.



Por: redação
Fonte: na moral
Foto: divulgação

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