Alguns grafites em São Paulo estão contrariando a
natureza efêmera desta arte de rua e, com apoio oficial, permanecem mais tempos
nas paredes e muros.
Um destes projetos foi criado pelo grafiteiro Arhur
Moriyama, o Subtu, para o conjunto habitacional do Parque do Gato, no Bom
Retiro, região central de São Paulo.
"Moro próximo dali, sempre vi estes prédios. É um
lugar ideal, tem muitos prédios, é uma região carente, não tem acesso à
cultura", disse Subtu à BBC Brasil.
O artista convidou outros para participar do projeto,
entre eles Thiago Mundano e Fel, e decidiu participar de um edital da
prefeitura.
Com a ajuda oficial, eles alugaram por 30 dias uma
plataforma aérea para trabalhar o dia inteiro em 15 obras de 15 metros de
altura, que podem ser vistas de longe.
Com o apoio dos moradores e da prefeitura, Subtu espera
que as obras fiquem nas paredes por tempo indeterminado, "até ser
danificada pelo tempo e poluição".
"É diferente da rua. Não rua não sabemos (quanto
tempo um grafite permanecerá intacto), é incógnita total. Este, como é
autorizado pelos moradores e prefeitura, se tornou uma galeria a céu
aberto", afirmou.
Subtu acrescenta que o grupo não pretende parar apenas no
Parque do Gato e quer levar o projeto para outros conjuntos habitacionais,
inclusive um na Água Branca.
Museu
Outra iniciativa, o Museu Aberto de Arte Urbana, começou
com uma detenção, em 2011.
Um grupo de grafiteiros estava pintando as pilastras da
estação de metrô na avenida Cruzeiro do Sul, em Santana, quando a polícia
chegou e os levou para a delegacia do Meio Ambiente, onde foram acusados de
crime ambiental.
Na delegacia, o grupo de 16 artistas, formado por
Chivitz, Binho Ribeiro, Minhau, Akeni e outros, começou a elaborar um projeto
para que sua arte não fosse encarada como um crime, daí surgiu a ideia do
museu.
Binho Ribeiro e Chivitz começaram a buscar parcerias e
autorizações, viabilizando tudo junto à Secretaria Estadual da Cultura, ao
Metrô e à Prefeitura.
Desde então, a iniciativa, considerada inédita, colore as
pilastras dos dois lados do elevado entre duas estações de metrô.
"Eles (os grafites) não têm nenhuma proteção, não
sofreram agressão, ou seja, tem um respeito. Houve um projeto cuidadoso para
incluir vários artistas da região", disse Binho Ribeiro, um dos curadores
do "museu".
Binho conta que até houve uma tentativa de colocar grades
em volta dos grafites para proteger as obras, mas as poucas que foram colocadas
foram retiradas logo depois devido à pressão dos próprios artistas,
comerciantes locais e opinião pública. Ainda assim, não houve dano maiores aos
painéis.
Os grafiteiros queriam continuar com o projeto com o
apoio da Secretaria Estadual da Cultura, por meio de sua assessoria, informou
que "não dará continuidade ao incentivo neste ano". "Apesar
disso, a pasta mantém o apoio à produção artística neste segmento, por meio de
seus programas de incentivo ProAC Editais e ProAC ICMS, que podem, inclusive,
ser pleiteados pelos organizadores do museu".
'A rua decide'
Na zona norte da cidade, uma parte dos muros do Cemitério
Vila Nova Cachoeirinha ganhou novas cores depois de um encontro de grafite
promovido pelo Centro Cultural da Juventude, com a curadoria do grafiteiro
Bonga.
Ao todo, participaram 40 grafiteiros no evento que, de
acordo com o curador, foi uma "intervenção, uma ação de apoio aos artistas
de rua". Entre os nomes que coloriram os muros do cemitério estão Joks,
Oco Sapiens, Chileno, Black Sheep e Cabelin.
Para Bonga, o apoio do Centro Cultural da Juventude e a
participação de nomes famosos do grafite, não garantem a permanência das obras
por muito tempo.
"(Grafite) É efêmero, a rua é quem decide",
afirmou.
Bonga grafita há cerca de 16 anos e começou em Caieiras,
cidade próxima de São Paulo. Dali, ele partiu para a zona leste da cidade. Para
ele, muitos estão se apropriando da linguagem do grafite.
"Existe um modismo na linguagem, muita gente se
aproveitando, como no hip hop. Mas a rua não tem dono."
Muros da memória
Eduardo Kobra também tem grandes murais autorizados
espalhados pela cidade. O grafiteiro começou em 1987, aos 12 anos, muito
influenciado pela cultura hip hop. Com o passar dos anos, seu estilo foi
mudando e ele criou o projeto Muro das Memórias, que espalhou por avenidas da
cidade grandes murais com cenas da São Paulo antiga, geralmente em preto em
branco.
Na Igreja do Calvário, em Pinheiros, Kobra fez dois
murais coloridos, um mostrando o Monumento às Bandeiras e o outro, o viaduto
Santa Ifigênia.
O artista disse à BBC Brasil que os painéis surgiram
"com o aprimoramento do meu projeto Muro das Memórias, que geralmente
acontecia com pinturas em preto e branco, mas, de um tempo para cá, passou a
ter formas e cores".
Para Kobra, pintar nas ruas é uma questão pessoal.
"Faço isso desde os 12 anos e vou seguir fazendo,
independente de status, galerias, convites (...). Penso que de alguma forma,
todos devem colaborar para melhorar a cidade em que vivemos, doando algo de si
para isso, seja evitando jogar lixo, por exemplo. As obras representando o que
tenho de melhor para doar à cidade e aos moradores, representam o amor que
tenho por São Paulo."
Por: Flavia Nogueira
Fonte: bbc.co.uk
Foto: divulgação
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